Recém chegado a Santa Margarida, e face à nossa nova realidade, o deployment das nossas forças em missões de manutenção de paz na Bósnia i Herzegovina, as conversas dos "novos veteranos" ocupavam boa parte do nosso quotidiano, até porque o Batalhão onde havia sido colocado, tinha participado numa missão dessa natureza, (e pela primeira vez), há cerca de seis meses atrás.
O pessoal decorria o tempo a desfilar pormenores da missão naquelas paragens, o que me estimulava a imaginação, ao tentar acompanhá-los. Numa dessas estórias, que me espantou sobremaneira, confesso, tomava protagonismo um capitão, (C.) com quem eu já me havia cruzado nos tempos da Academia Militar, e de quem eu tinha a mais alta consideração e apreço. E qual era a estória?
Precisamente um logro, (dos maiores, ainda por cima), na realização de operações de segurança. Segundo o relator, o dito capitão, ao regressar ao aquartelamento, e de acordo com as regras estabelecidas, aproximou-se do recipiente de areia onde eram realizadas as operações de segurança, retirou a sua Walther P-38 do coldre, puxou a corrediça à retaguarda, (o que implica que, quando a mesma regressa à frente por acção da mola, uma munição é inserida na câmara da arma), e, apontando para o recipiente, deu uma inocente gatilhada que se saldou no enorme estrondo de um disparo, obviamente. O dito capitão terá olhado para a arma, proferido uns impropérios, retirado o seu carregador e voltado a tentar a tal inocente gatilhada. Ora, por efeito do disparo anterior, a corrediça havia-se deslocado atrás e no regresso à frente, nova munição se apresentou na câmara, pelo que novo disparo foi efectuado. No meio de foda-se, foda-se, à terceira a arma não disparou pois já não tinha munições.
O que me deixou perplexo foi o facto de um indivíduo experiente, (bastante experiente aliás), ter-se prestado a tal ocorrência. Não percebi, confesso.
Tudo ficou mais claro quando, cerca de dois anos após este relato, eu próprio segui em missão para a Bósnia i Herzegovina. Já bem perto do fim da missão, e após ter efectuado as regulamentares operações de segurança vezes e vezes sem conta, antes de entrar no edifício onde nos encontrávamos aquartelados, retirei a minha Walther do coldre e puxei instintivamente a corrediça à retaguarda (com o carregador ainda na arma), coloquei a patilha de segurança em "fogo" e, ao apontar para o recipiente (e prestes a fazer exactamente a mesma asneira do tal capitão), ouço uma voz atrás de mim:
- Meu Alferes, o que é que está a fazer? – Era o meu bom amigo FM, com quem havia sido, o qual era talvez o condutor mais batido do batalhão.
-As operações de segurança. – Respondi. – Olhei para ele e, face ao seu sorriso de orelha a orelha, só nesse momento me apercebi que algo de muito errado estava prestes a acontecer. Nesse momento, parei para pensar e vi que havia apresentado munição à câmara. Retirei o carregador, retirei também a munição da câmara, concluí as operações de segurança em boa ordem e agradeci ao FM.
Nessa noite, soube-me bem ter-lhe pago as bebidas, pois ele havia-me salvo da implacável consequência de ter um bar aberto às minhas custas, e para todo um batalhão.
Há coisas na vida em que é necessário pensar e evitar a todo o custo que o instinto tome lugar, sob pena de podermos virmos a nos arrepender seriamente. Compreendi finalmente o que se tinha passado com o tal capitão.
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